Há muito sou admirador do Boechat e agora sou ainda mais
Não se trata de sentir felicidade ou de compaixão pela dor alheia, muito menos quando se trata de uma pessoa com o caráter e da estirpe de Ricardo Boechat, contudo, achei muito nobre a forma como ele tratou e levou ao público o quadro depressivo que enfrentou ou está enfrentando.
Nesse mundo moderno onde a aparência tem mais valor do que o conteúdo, a maioria das pessoas com notoriedade semelhante, de âmbito nacional, enfim, celebridades (na acepção positiva da palavra), seria compreensível e humano que Boechat se preservasse e mantivesse em seu âmbito privado esse momento especial pelo qual passou ou passa.
Portanto, a maneira como trouxe ao domínio público um sofrimento pessoal, certamente que atinge um enorme número de pessoas em algum momento ou por grande parte da vida, me parece louvável e exemplar, razão pela qual recomendo a leitura do text postado por ele no Facebook: https://www.facebook.com/ricardoboechatoficial?fref=photo
Abaixo coloco o texto e o vídeo, ambos postados no Facebook do próprio Ricardo Boechat.
Grande exemplo a ser seguido.
Sergio Luiz Teixeira Braz
"Acho que devo uma explicação às
centenas de pessoas que me escreveram nos últimos dias perguntando o que eu
tinha e desejando minha pronta recuperação.
Pois bem, queridos amigos, o que eu tive
foi um surto depressivo agudo. Minutos antes de começar o programa de rádio da
quarta-feira retrasada eu simplesmente sofri um colapso, um apagão aqui no
estúdio. Nada na minha cabeça fazia sentido. Nenhum texto era compreensível. Os
pensamentos não fechavam e uma pressão insuportável dava a nítida sensação de
que o peito ia explodir. Fiquei completamente desnorteado e achei melhor me
refugiar no meu camarim e esperar socorro médico. Quando finalmente minha doce
Veruska me levou ao doutor e eu descrevi o que estava sentindo ele foi
categórico em dizer que era depressão. Que o estado de pânico, a balbúrdia
mental, a insegurança e tudo mais eram sintomas clássicos do surto depressivo.
Quem cai num quadro desses perde qualquer
condição de continuar ativo, de pensar as coisas mais simples. A pessoa morre
ficando viva.
E eu fiquei impressionado nestes dias com
a quantidade de gente que sofre do mesmo problema. Quando contei a alguns
ouvintes que me ligaram o que estava acontecendo, muitos disseram já ter
passado por isso, ou conhecer alguém que ainda passa ou já passou.
O Barão me mostrou um vídeo produzido
pela ONU indicando que esse fenômeno é global. Uma amiga minha citou números da
Organização Mundial da Saúde afirmando que a depressão é a doença que mais
cresce no mundo. E o Bruno Venditti me mandou um texto muito bom do pregador
Élder Holland sobre o assunto.
Tanto o vídeo da ONU quanto esse texto
deixam claro que é importante não esconder a doença, não esconder a depressão.
Não tratá-la na clandestinidade. É importante aceitá-la para combatê-la - e
todo o silêncio, do próprio doente ou de quem está à sua volta, dificulta a
recuperação. Essa necessidade de não fazer segredo, além da sinceridade que
faço questão de manter na relação com os ouvintes, é a razão deste depoimento
pessoal.
O texto que eu li fala do “transtorno
depressivo maior” lembrando que isso não significa apenas um dia ruim, ou um
contratempo, ou momentos de desânimo ou ansiedade, que são coisas que todos temos
normalmente.
A depressão é muito mais que isso e muito
mais séria. É uma aflição tão severa que restringe a capacidade de uma pessoa
funcionar plenamente, um abismo mental tão profundo que ninguém pode achar que
vai se safar apenas endireitando os ombros ou pensando coisas positivas.
Não, minha gente, essa escuridão da mente
e do estado de espírito é mais do que um simples desânimo. É um desequilíbrio
da química cerebral, algo tão físico quanto uma fratura óssea, ou um tumor
maligno. É um fenômeno que atinge todo mundo: quem perde um ente querido, mães
jovens com depressão pós-parto, estudantes ansiosos, militares veteranos,
idosos de uma maneira geral e pais preocupados com o sustento da família.
A depressão não escolhe vítimas por seu
grau de instrução ou situação econômica. Castiga sem piedade e da mesma forma
pobres e ricos, anônimos e famosos.
Os médicos que estão me tratando disseram
que eu estiquei a corda demais, que fiz mais coisas do que deveria fazer e em
menos tempo do que seria razoável. Eu fui além dos limites que minha saúde
permitia e ignorei todos os sinais físicos e avisos domésticos. Quantas vezes a
minha doce Veruska me disse: "Você vai pifar! Você vai pifar!"...
O texto que eu li ensina que para
prevenir a doença da depressão é preciso estar atento aos indicadores de
estresse em sua própria vida. Assim como fazemos com nosso carro, é fundamental
observar a temperatura do nosso motor interno, os limites de nossa velocidade,
ou o nível de combustível que temos no tanque. Quando ocorre a “depressão por
exaustão”, que foi o meu caso, é preciso fazer os ajustes necessários. A fadiga
é o inimigo comum e recuperar forças passa a ser uma questão de sobrevivência.
A experiência mostra que, se não
reservarmos um tempo para nos sentirmos bem, sem dúvida depois teremos que
dispender tempo passando mal. E foi o que aconteceu. Mas a cura existe. Às
vezes requer tratamentos demorados. Mas, como está no texto que eu li,
"mentes despedaçadas também podem ser curadas, assim como corações
partidos".
Eu sei que quem liga o rádio numa estação
de notícias quer receber informações de interesse geral, quer saber da
política, da economia, dos acidentes, do engarrafamento nosso de cada dia.
Então peço desculpas por não entregar
nada disso a vocês neste papo inicial no dia de minha volta. Nada de
impeachment, de renúncia, de Cunha, de Renan, de inflação, do ajuste fiscal e
de tantas outras coisas que só têm feito infernizar nossas vidas mas que são as
manchetes do momento.
Não falei neste bate papo nem mesmo das
abobrinhas de que eu gosto tanto e que nos ajudam a cumprir a jornada diária
sofrendo menos.
Este papo de hoje é sobre depressão. Um
mal que afeta milhões de pessoas, milhares delas no Brasil, um mal sobre o qual
é preciso estar informado e não fazer segredo.
Como eu agora me descobri fazendo parte
dessa população doente, pensei muito nas noites sem dormir dos últimos dias e
tomei a decisão de dividir essa experiência com vocês. Se com isso eu conseguir
ajudar algum ouvinte a prevenir a depressão ou a curá-la, já me dou por
satisfeito.
E toca o barco."
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